quinta-feira, 20 de setembro de 2012

Santa

Estudo originalmente publicado na revista “Nature” sobre 90% das meninas que estudaram no Gracinha, Santa (Vera) Cruz e similares.

São meninas bonitas. A beleza, assim como a renda, é mal distribuída no Brasil. Para pagar uma mensalidade dessas, é necessário ter no mínimo um Tucson, um Civic e um Gol (do rodízio) na garagem. Diferente do Colégio Porto Seguro, onde a mãe é completamente linda, idiota e fitness e o pai é mais um herdeiro em decadência, no caso dos colégios supracitados há um certo nível intelectual nos genitores. Inteligência essa que desaparece quando ouvimos coisas do tipo: “Só consegui uma vaga para minha filha porque estudei lá” ou “Minha filha foi a primeira no vestibulinho.” Infelizmente, essas meninas crescem achando que são “foda”. Pena que durante todos esses anos e depois na ESPM, FAAP ou USP, caso o cursinho seja bom, “foda” seja a última coisa que elas têm em mente. Sim, essas garotas têm problemas sexuais. Muitas delas colocam silicone, mas têm medo que o namorado estoure as próteses numa relação levemente mais sádica. Essas jovens mantêm sempre uma mão entre os dois corpos em ação. Just in case.

Meninas do Santa Cruz e Gracinha se sentem culpadas por serem apenas lindas. Elas não querem atrair olhares por terem corpos deliciosos graças à academia do prédio com ampla área de lazer, frequentada assiduamente desde a primeira menstruação. Elas querem ser inteligentes também. Acham que porque estudam em colégios que têm a falsa imagem de possuir currículos voltados à cultura, foram agraciadas com o dom do pensamento diferenciado. Então elas escolhem um ou outro assunto de interesse que as separem do mundo dos medianos. David Lynch é um exemplo. Mas não fazem noção de quem foi Laura Palmer. Muito menos viram o mais acessível e complicado filme dele: Straight Story. Tampouco sabem que não se pode pedir Heineken, mas Pabst Blue Ribbon. A única coisa que viram do topetudo foi Cidade dos Sonhos. E entenderam t-u-d-o.

Essas meninas cultivam amizades antigas. São outras garotas do mesmo círculo social e financeiro, que estudaram nos mesmos colégios, frequentaram os mesmos clubes (principalmente nas festas juninas) e fizeram intercâmbio para os mesmos lugares. Obviamente, quando você é adolescente, não tem o mínimo critério para amizades. É natural que depois que você obtém uma personalidade (na maioria dos casos é necessário comprar uma), escolha seus amigos com maior dedicação. Aliás, não existe nada mais brochante nessa vida do que ter a infelicidade de sentar ao lado de uma mesa repleta dessas mulheres em alguma Temakeria & Cia da vida. A vontade de pegar o hashi e enfiar no olho do, quer dizer, da menina é algo terrível.

Tais meninas santas e graciosas não vão para o céu. Porque nós sabemos que elas estão mentindo a cada inspiração (e expiração). São fantoches da sociedade paulistana. Casam com idiotas do mercado financeiro ou publicitários/videomakers. Fazem encontros semanais em algum apê no Morumbi ou Alto de Pinheiros para falar obviedades, fofocar e tentar entender David Lynch. Por mais que os namorados as tratem mal e, principalmente, as levem para jantar no Lorena 1989, elas continuam ali, fiéis como poodles tingidos de rosa. Se o mundo contradiz uma dessas gracinhas, logo pensam: “Com certeza é porque eu não quis dar para ele”. Como se, ainda mais no caso delas, fosse possível dar para todo o mundo!

quinta-feira, 19 de maio de 2011

Acossada.

-"Taxista, siga aquele carro!"
-"Que carro, moça? Só tem a gente na rua."
-"Desculpa, eu sempre tive vontade de falar isso. Vamos para Berrini mesmo."

quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

Estocolmo.

Precisava de dinheiro. Sequestrei você. Como sempre gostei da Suécia, foi natural me apaixonar por todas as partes do seu corpo. Seu pai não quis pagar o resgate. Então cortei tua orelha direita. Enviei você de volta como aviso e fiquei com a orelha só para mim.

Gritei no telefone: "Vinte milhões de euros se quiser ver essa orelha de novo!"

terça-feira, 18 de janeiro de 2011

Liebe.

Werner, 205cm, era louco por Petra, 145cm. Tão louco, que estava sempre a beijar a boca da menina. O tempo inteiro. Foram 3 anos de amor torrencial.

Então Wevê ficou corcunda. E Pepê o largou.

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

Hipo.

Por um instante, você pareceu ser a mulher da minha vida. Aquela com que eu ia casar, ter filhos, comer fondue na praia em janeiro, dançar baboseiras eletrônicas de 200 bpm como se fossem lentas da época do colégio. Até recitar Maria Rilke só para você eu ia! Mas, de repente, vi você bebendo água. Nenhum problema, se você não estivesse encostando os lábios no bocal do bebedouro.

Me enganei totalmente a seu respeito.

Barra Funda.

No meio do julgamento, o réu confesso (crime hediondo) virou para o júri, apontando para mim entre os 7, e disse: "Quem é você para decidir a minha vida? Você não consegue nem decidir a sua."

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

Platinum.

Fizemos quatro anos de casamento. Comprei seu presente em 12 vezes de R$13,00.
Não que eu tenha ficado pobre depois que comecei a viver do seu lado.
Mas é que queria conseguir lembrar de você pelo menos por mais um ano.

Nem que fosse só no dia que a fatura chegasse.

quinta-feira, 19 de agosto de 2010

Best of.

Li na Dazed que era cool. Gravei uma mixtape para você. BASF Ferro Extra I. Afghan Whigs + The Zombies + Misc. Você adorou. Só disse que não tinha tape. Nada de auto-reverse. Nada de duplo deck. Ótima ideia. Vamos fazer um chá. Chá de fita. Dor nos rins. Você disse para mim: ficou boa essa reforma no Samaritano, hein?

terça-feira, 17 de agosto de 2010

Neve.

Dr. Neuer é um cardiologista respeitadíssimo do hospital de Innsbruck. Suas técnicas excêntricas têm obtido sucesso na comunidade internacional, inclusive em Hollywood, famosa pelo acolhimento a austríacos. Seu procedimento mais inovador é bastante controverso: ao invés de um marca-passo, Dr. Neuer implanta no coração de seus pacientes um navegador GPS.

quinta-feira, 29 de julho de 2010

Bula

Ele amava Cristina. Cristina não o amava. Nem podia, já que ele nunca se abriu com ela. Durante 39 anos, guardou aquele segredo dentro dele. Obviamente, esse segredo se transformou em câncer. Dois anos antes de morrer, fez quimioterapia.

E foi ali, sem ligar muito para o prefixo, que pôde finalmente ter (direto na veia) o que sempre quis: vincristina.

segunda-feira, 19 de julho de 2010

Mar

Toda vez que iam ao litoral, ele pedia para ela usar fio dental. Ciúmes zero. Nada dava mais prazer a esse homem do que aquela cena. Não se importava com a sujeira de um dia inteiro na praia: depois que sua esposa usava o tal fio dental, ele implorava para lamber e mordiscar aquele fio inocente. Inclusive engolia as impurezas, sempre com o maior tesão. Toda noite era a mesma coisa. Lá estava ele no banheiro, como um cão aguardando o osso, à espera da mulher terminar de limpar suas gengivas.

domingo, 27 de junho de 2010

Fazenda

Enquanto esperava na fila da farmácia, ouvi você dar o número do seu CPF ao caixa. Pronto: Nota Fiscal Paulista. Ter algo em comum, esse desejo por 30% do ICMS de volta, foi o suficiente para eu me apaixonar. Mas você foi embora com sua caixa de Valium.

Me senti como um contador: seus 11 números para sempre na minha memória e um monte de contas para acertar.

quarta-feira, 9 de junho de 2010

Becel

Comprei dois quilos de explosivos e um bisturi. Você sempre bebeu muita vodca, o que dispensou o anestésico. Enquanto você dormia, totalmente bêbada, fui abrindo seu tórax lentamente com o mesmo cuidado de quem toma uma sopa de ervilhas muito quente e não quer queimar a língua. Que cena linda: dinamite, átrios e ventrículos. Explodi seu coração.

Você nunca precisou dele mesmo.

segunda-feira, 24 de maio de 2010

Paternidade.

Marcella deu um beijo de tchau em seu pai, enquanto se dirigia à porta. Rapidamente ele pegou um papel, anotando algo ali. Entregou a ela e disse para só abrir ao chegar no Carnafacul, a micareta para onde Má ia com mais 5 amigas. Perto do Anhembi, lembrou do bilhete.

Ao abrir, leu: "Mononucleose, Herpes, Citomegalovírus, Sífilis, Hepatites A, B e C, Cárie, Meningite, Gripe e HPV. Cuide-se, meu bebê."

domingo, 9 de maio de 2010

Bivolt

Era a nossa lua-de-mel nos alpes austríacos.
Tínhamos um acordo: apenas uma e não dezenove vezes como faria um casal comum, desesperado e, provavelmente, evangélico. Duração? Três horas e meia sem tirar. "Danadinho esse Cymbalta... Delícia de efeito colateral, amor!"

De repente, sistema de calefação pifou. O cigarro tinha sido outro acordo, então faltava isqueiro para acender a lareira.

Só nos restaram cobertores e... um secador de cabelo, que usei em você na velocidade três. Percorria todo o seu corpo em movimentos circulares e precisos. Que belo corpo, que belo design esse da brAun. Lembro de ter me emocionado quando ouvi: "Sua criatividade me excita, amor!".

quinta-feira, 22 de abril de 2010

38

Quando fomos assaltados na 9 de julho, senti seu corpo tremer no banco do carona.
Passa sua carteira e o anel dessa vaca, disse o ladrão.
Com a arma apontada para a minha cabeça, não tive dúvida: enfiei a mão do marginal dentro volante e girei sem dó, até ele largar o revólver.
Você me olhou com um olhar inédito, tenro, excitado.

Pois saiba que eu tinha contratado aquele cara para fazer esse serviço. E não me culpe por querer ser seu herói.

terça-feira, 6 de abril de 2010

Soja.

Não podia ser diferente. Então comecei pelos seus pés. Depois fui para as pernas. Primeiro a deliciosa panturrilha, depois as suculentas coxas e finalmente o começo do bumbum. Tenho que admitir, as nádegas deram trabalho. Mas você adorou o resultado. Continuei subindo. Barriga, seios, pescoço... até chegar no meu lugar preferido: suas bochechas.

Juntei todos os pedaços no prato. Já te disseram que você dá um ótimo Steak Tartar?

sexta-feira, 2 de abril de 2010

Cuidados.

Comprei uma capa para o iPhone.
Deixei o plástico nos bancos do carro novo.
Coloquei o laptop dentro do case.
Enrolei seu corpo no plástico bolha.

Queria que você ficasse assim, desse jeitinho, para sempre.

Pena que você morreu sufocada.

quarta-feira, 10 de março de 2010

Infância.

Quando eu tinha 3 anos, você quis fazer amor comigo.
Pena que você era muito mais nova do que eu.
O que o código penal ia pensar de mim?

Talvez seja tarde, mas preciso te dizer uma coisa: você era a menina mais gostosa do berçário.

terça-feira, 9 de março de 2010

Casamento.

Aos poucos fui envenenando nosso relacionamento de 9 anos.
Minha ideia era que você terminasse tudo, porque, você sabe, sou covarde.
Depois de 1 ano, o juiz aceitou o pedido de divórcio.

Por que eu não consigo tirar sua foto da carteira?

Antes.

Queria conhecer você por inteiro, antes de qualquer coisa.
Cada estria, cada celulite, cada mancha de velhice, cada buraco de acne mal cicatrizado.
E vai que você não faz aquilo com a língua que eu gosto tanto.
Para que gastar todos meus truques de sedução baratos?

Desisto de você. Agora.

segunda-feira, 8 de março de 2010

Cadillac Eldorado 55'

Anotei a placa do seu carro. Aliás, tenho que admitir, belo veículo para um gênero que não entende nada de automóvel.
Liguei para o meu despachante e, mentindo, disse que você bateu no Civic da minha mãe.
Consegui seu nome, endereço, telefone e chocolate preferido através de uma comunidade no Orkut.

No fundo, o que sempre me excitou foi o fato de você nunca saber quem te mandou aquele Toblerone branco.

Desejo.

Quero ser o primeiro diretor brasileiro, mesmo que com sangue totalmente albanês, a ganhar um Oscar.
Quero ser o primeiro presidente a legalizar o uso recreativo da morfina.
Quero ser o primeiro homem a transar com mais de 5000 mulheres sem pegar nenhuma variante de HPV.

Mas tudo bem se eu quiser apenas ganhar um salário de merda para sustentar minha filha do primeiro casamento.

Namoro na TV.

Coloquei seu nome no Google.
Queria saber tudo sobre você.
Mas só te encontrei em listas antigas com resultados de vestibulares.
Descobri que você queria ser médica, mas acabou entrando em biomedicina.

(Só queria que você soubesse que eu não me importo em ser a segunda opção.)

Prepúcio.

Quando disse que nunca mais queria te ver, eu falava sério.
Mas quando fui operar minha fimose, lá estava você.
Na maternidade do Einstein, tendo seu 3º filho.

Sem mim.

segunda-feira, 6 de abril de 2009

Aconteceu em 2005.

Roperto, apesar do nome italiano, era holandês. E, como todo filho único, queria tudo para ontem.

Trabalhava num coffee shop em Amsterdam. Não tinha namorada, já que não era nem bonito como um italiano muito menos como um holandês. Já tinha tentado uma ou duas vezes se aproveitar de turistas brasileiras que haviam exagerado no haxixe. Mas não deu certo. E a legislação holandesa, por mais irônico que isso seja, é bastante severa. Como foi dito antes, ele tinha pressa.

Não deu outra: foi para a casa numa segunda-feira qualquer com suas tensões sexuais à flor da pele. Ele era viciado em pornografia. E a internet era uma espécie de Waterworld (aquele filme terrível com o Kevin Costner): Roperto estava sempre com sede (de água doce ou salgada).

Abriu seu Firefox. Qual era o cardápio do dia? Teenagers? Milfs? MMF? FFM? Enfim, resolveu que queria experimentar algo diferente. Entrou num site parceiro do qual já era assinante. O site era uma novidade até para ele: grávidas fazendo sexo.

Roperto começou a baixar um vídeo. Aquilo parecia excitante, já que quase nada mais o excitava. O vídeo já estava em seu desktop. Preparava-se para uma longa e entediante masturbação. Preocupava-se mais com o efeito anti-estressante do orgasmo do que com o prazer em si. A janela do Windows Media Player abriu. O vídeo era antigo. (A moda Vintage também pegou no mundo pornô.) Nele, uma mulher linda com uma enorme barriga chupava um homem horrível. Depois transava loucamente com outro homem. E depois com outro. E no final todos gozavam na cara dela.

Roperto queria, mas simplesmente não conseguiu usar o mouse para fechar o programa. A mulher do vídeo era mãe dele.

quarta-feira, 1 de abril de 2009

Não sei exatamente o porquê. Mas agorinha mesmo. Agora. Agorinha. Me deu uma vontade enorme de responder para a secretária que queria meu contato:

"Oitenta milhões, duzentos e sessenta e um mil, quatrocentos e vinte e três."

sábado, 27 de setembro de 2008

In some party around the world...

-Hi. What`s your name?
-Doesn`t matter.



-Hi Doesn`t matter. How are you?

segunda-feira, 15 de setembro de 2008

Last lines of Stroszek (Werner Herzog)

Deputy Sheriff: "We have a 10-80 out here, a truck on fire, we have a man on the lift. We are unable to find the switch to turn the lift off, can't stop the dancing chickens. Send an electrician, we're standing by."

terça-feira, 2 de setembro de 2008

Banca de Jornal

Antes de sonhar em ser porteiro (eles têm o dia inteiro para ler livros russos, por exemplo), sonhava em ter uma banca de jornal.

E se engana quem pensa que é só por causa da enorme quantidade de revistas disponíveis. Sim, você pode ler, no trabalho, a Variety, Playboy, GQ, Mundo Estranho (minha revista preferida), SuperInteressante, Vip, até aquela porcaria da Men's Health, que todo mês repete a matéria da barriguinha sarada. Mas não é isso.

Só uma coisa, desde pequeno, me fascinava no fato de ser dono de uma banca de jornal: a possibilidade de dormir lá dentro durante a noite. Sim, eu me imaginava fechando a banca, lá pelas oito horas. Depois, lendo algum livro interessante, já que naquela altura eu estaria por-aqui de revistas. Depois, assistindo algum filme no Eurochannel. E depois vendo uma meia hora de VH1 Classic.

Sei lá por que eu pensava nisso. Só sei que era bom ter planos para o futuro. Já que quando o futuro chega, você só tem planos para o passado.

sábado, 30 de agosto de 2008

Sacola

Sabe o que é amor?
Amor é o que ele viu no metrô naquele dia.

Era um casal cheio de sacolas. Muitas compras no supermercado, na volta para casa. Aquilo tudo era para os filhos? Para os dois? Um jantarzinho íntimo no sábado, pode ser. Ela não era mais a mesma de 5 anos atrás. Mas ainda era amor. Sabe por quê?

Porque ele segurava com uma mão uma sacola pesadíssima. E com a outra, segurava o punho da mulher, que segurava outra sacola pesada. Ele que fazia toda a força.

quinta-feira, 28 de agosto de 2008

Coruja

Uma vez meu pai encontrou uma coruja com a perna quebrada no meu ex-sítio. Não teve dúvidas: levou-a para minha ex-casa. Colocou-a dentro de uma caixa grande de garrafas Minalba. A caixa ficava num quartinho, que ficava ao lado do quarto da empregada e da área de serviço.

Era uma coruja legal. Parecia estar sempre triste. Não pela perna quebrada, eu acho, mas por estar longe de casa. De qualquer jeito, corujas parecem estar sempre tristes. Então ela poderia parecer triste por qualquer coisa. Inclusive por não estar triste.

Sei que, às vezes, acordava de madrugada e ia até lá ver como a coruja estava. Talvez quisesse tirar a limpo aquela estória de que essas aves dormem de dia e ficam acordadas à noite. E lá estava ela, com os olhos semicerrados. Estava dormindo? Estava acordada?

Eu tinha 8 anos. Ainda tenho saudades da coruja.

domingo, 3 de agosto de 2008

Grande Roy.

Golden days before they end
Whisper secrets to the wind
Your baby won't be near you any more

Tender nights before they fly
Send falling stars that seem to cry
Your baby doesn't want you any more
It's over

It breaks your heart in two
To know she's been untrue
But, oh, what will you do
When she says to you
There's someone new
We're through, we're through
It's over, it's over, it's over

All the rainbows in the sky
Start to weep, then say goodbye
You won't be seeing rainbows any more

Setting suns before they fall
Echo to you that's all, that's all
But you'll see lonely sunsets after all

It's over, it's over, it's over
It's over

quinta-feira, 31 de julho de 2008

Breve diálogo #451

- Você já foi para as ilhas Cook?
- Não, ainda não encontrei a pessoa certa.

domingo, 27 de julho de 2008

Faça um seguro de automóvel. Um dia você pode não precisar.

Fabrício tinha um belo carro. Air-bag duplo, bancos em couro, rodas 20 polegadas. Desses que fazem as mulheres ficarem úmidas quando o vêem. E porque as mulheres gostam de carros? Porque carros são sinônimos de dinheiro. E dinheiro é sinônimo de segurança. E toda mulher procura segurança, óbvio. Desde quando existiam dinossauros.

Mas Fabrício queria vender seu carro justamente por causa disso. Queria uma mulher que se sentisse segura ao lado dele não por causa do carro. Sim por causa de seu abraço forte. Era uma segurança momentânea, é claro, mas pelo menos não envolvia dinheiro. Talvez a única que não envolvesse.

Então Fabrício foi em exatamente 27 lojas. Todas ofereceram um valor baixíssimo pelo carro. Uma hora falavam que era a cor, dourado. Outra hora falavam que era o câmbio, que não era automático. Mas se fosse, diriam que preferiam o manual. Nessa fase da vida, ele não ligava muito para dinheiro, mas também não era bobo. Queria o valor justo. Em vão. Malditos vendedores de lojas de carros usados.

O garoto de 20 anos teve uma idéia: dar PT (perda total) em seu carro. Assim receberia o valor de tabela do carro, algo justo na cabeça dele. Aí ficou na dúvida. Não sabia se batia de frente para pegar o motor, o que certamente levaria à PT, ou se batia de lado, para pegar a coluna lateral, algo também bastante convincente em termos de perda total.

Escolheu uma sexta-feira, para parecer que tinha bebido ou que estava cansado demais depois de uma noite inteira de olhares mal sucedidos. Se fossem bem sucedidos, tudo seria um grande mal entendido, como sempre. É a vida.

Resolveu bater de frente mesmo. Não é assim que seus amigos diziam? "Encare a vida de frente." Como se desse para encarar algo de costas, não é? Então lá na Av. Rebouças, enfiou seu carro no 5 poste que viu. Nunca achou que a coragem pudesse ser quantificada em 4 postes, mas enfim.

Ao bater, seu Air-bag não abriu. Apenas o do passageiro.

Onde deveria estar sua ex-namorada, que, horas depois, choraria muito no seu velório, culpando-se ao achar que aquele pobre homem jogou seu carro num poste por causa dela, não por causa das práticas hediondas do mercado de veículos usados.

Pobre moça.

2046

Irina estava andando pela avenida paulista no sentido Consolação. John, no sentido Paraíso.

Próximo à livraria Martins Fontes, os dois se cruzaram. Foi um cruzamento diferente desses que acontecem todo dia. Sabem por quê? Porque eles se olharam. E, hoje em dia, ninguém mais se olha na rua.

Mas, então, eles se olharam. E foram um passando do ponto do outro, sem virar os rostos.

Um segundo e meio depois, Irina virou sua cabeça para trás, para ver se John a olhava. Não olhava.

Um segundo após Irina voltar sua cabeça para a posição original, ou seja, para a frente, John se virou para ver se Irina o olhava. Não olhava.

E foi isso. Um quase isso. Como quase sempre.


Afinal, como diria o chinês do título desse texto, "o amor é uma questão de timing".

domingo, 13 de julho de 2008

Fim

A coca light. O filme. A noite. O sono. O sonho. O remédio para o sono. O esmalte. O amor. A viagem. O álbum do Sígur Rós. As amizades. O livro. O tesão. A vontade de comprar. A vontade de vender. O carré de cordeiro com cuscuz marroquino. O risoto daquilo, risoto disso, risoto de sei lá o quê. A família. O romance. O mistério. O suspense. O drama. O terror. O abril. O dezembro. O outono. O cheiro daquela lembrança. A doença. O limite do cartão de crédito. A crença. A dúvida. O desejo. A falta de desejo. O xarope para tosse. A tosse. A vida.


...as coisas, de uma hora para outra, simplesmente acabam.

Sinceridade

Entre as milhares de coisas que me chateiam na vida, uma das piores é, sem dúvida, a impossibilidade de ser sincero.

Por exemplo, você encontra uma garota interessante numa festa. Na sua cabeça, sabe-se lá por qual motivo, você realmente acha que a conhece de algum lugar. Ok, pode ser dos seus sonhos, pode ser de outra festa em que você estava totalmente bêbado, não importa. O que importa é que você realmente acha que a conhece de algum lugar (faço questão de repetir, já que isso é totalmente possível devido às mesmas baladas, mesmos círculos de amizade, etc.). Só que experimente chegar nela e dizer: "Ei, eu não te conheço de algum lugar?". Já era, amigo.

Outro exemplo: você não aguenta mais machucar sua namorada. Afinal, você é uma pessoa horrível e não quer ser mais horrível ainda com as pessoas que você realmente gosta. Então você decide terminar o namoro. Só que o problema é você, isso é fato. Não é ela. Agora experimente chegar na sua namorada e dizer: "Sabe o que é? O problema não é você, sou eu. Vamos terminar.". Por mais que seja verdade, você acaba de se ferrar. Mais uma vez.

É triste, não é?

sábado, 21 de junho de 2008

Tylex

Marcello não estava bem. Só conseguia pensar numa coisa: "Por que o Tylex vem com paracetamol? Não podia vir só com codeína? Por quê? Por quê? Por quê?"

Para quem não sabe, dizia ele, o paracetamol é metabolizado no fígado, o mesmo lugar em que isso ocorre com o álcool. Quando se mistura os dois, falando de um jeito leigo, temos um grande problema enzimático. Ou seja: bebeu muito numa noite? Ficou com dor de cabeça no dia seguinte? Tomou um Tylenolzinho para a dor passar? Se ferrou, meu amigo.

E por que ninguém fala disso abertamente, como se fala de receitas preferidas de Mojito ou de como é chato transar com pessoas de meia? Em primeiro lugar, se a menina tiver pés feios, acho muito sensível da parte dela não tirar a meia. Mas, concluindo, sabe-se lá porque ninguém fala nesse perigo do Tylex. Marcello falava.

O jeito é não beber. Porque se um lado Marcello tem a deliciosa sensação da mistura codeína + álcool, tem também a fulminante sensação de perder um pedaço do fígado graças ao paracetamol + álcool.

É, pensou Marcello, está ficando cada vez mais difícil viver por aqui.

sexta-feira, 14 de dezembro de 2007

Encontrado o braço de Dagoberto.

( leia o texto "Atlantic City" e depois entre em http://noticias.uol.com.br/ultnot/agencia/2007/12/14/ult4469u15567.jhtm )

sexta-feira, 20 de julho de 2007

Under the milky way

Qual a melhor fase da vida, perguntou Maicon ao seu companheiro de trabalho. Eram os dois jardineiros. Ambos com primeiro grau incompleto, para não dizer primeira série. No critério Brasil, aquele que avalia o poder sócio-econômico da população, o resultado era sempre negativo mesmo somando a pontuação do duo.

Enquanto podava a grama, Uéscley respondeu: é qualquer fase anterior a essa que vivemos agora.

Depois de uma longa pausa, continuou: porque a memória só guarda as coisas boas, já percebeu? É um processo de auto-enganação. Veja só: até as coisas que te frustaram no passado, hoje são revestidas com uma espécie de ternura. Sabe quem inventou o termo Nostalgia? Foi um médico suíço em 1678. Era usada para traduzir a saudade da terra natal. Mas se a gente analisar a etimologia dessa palavra, veremos que "Nóstos", do grego, significa regresso, retorno. E "algia", como em fibromialgia, nevralgia, significa dor. Enfim, é a dor do regresso. Não a um espaço físico, mas sim a um espaço de tempo. Um retorno a algo que se perdeu, que nunca foi e que nunca será. Ou que foi mas acabou não sendo. Tipo uma festa de 15 anos que você deixou de ir. Ou uma em que acabou indo com seu melhor terno.

Maicon, sem saber que parafraseava Sartre, terminou a conversa:
- É verdade. Com 15 anos, é muito cedo ou muito tarde para se fazer qualquer coisa.

segunda-feira, 23 de abril de 2007

Tipos de depressão

Existem dois tipos de depressão que me intrigam.

A depressão pós-parto e a depressão pós-coito.

E por um simples motivo: são a mesma coisa.

Se eu tenho depressão, necessariamente ela veio depois do coito dos meus pais e do meu próprio parto.

Ou seja, toda depressão é pós-parto e pós-coito.
Então fica provado que existe um erro de terminologia grave na psiquiatria analítica.

segunda-feira, 16 de abril de 2007

Aniversário?

Hoje eu faço 23 anos.

É mentira.

Segundo dados recentes do IBGE,
estou fazendo -49.

segunda-feira, 9 de abril de 2007

Guia do Espermograma

Não há dúvidas que o espermograma é um dos poucos exames feitos com o maior prazer. Tem gente que gosta de eletroneuromiografia - com choques e microfones agulhados nos nervos periféricos. Tem gente que adora o gosto amargo e metálico do iodo aplicado como contraste na tomografia. Adoram mais ainda quando descobrem que o tumor é benigno. Para mim, o único câncer bom é aquele do zodíaco. Mas voltemos ao espermograma, esse sim uma unanimidade.

As pessoas realizam espermogramas quando querem ter filhos. Outras, quando há suspeita de varicocele, uma doença comum, complicada e gentil (a explicação envolve artérias e veias do rins que deixam de abastecer o escroto provocando lentamente um tipo de infertilidade). Mas ainda há outro tipo de pessoa, diga-se de passagem, muito respeitada por mim: a que realiza o espermograma por prazer. Pessoas fumam por prazer. Dão a bunda por prazer. Por que não fazer um exame por prazer?

Por isso, resolvi escrever esse pequeno guia, caso você esteja interessado em entrar para o clube. Lembrando que para a realização do exame é necessário uma abstinência sexual (seja ela propriamente dita ou apenas masturbatória) de 2 dias, não podendo exceder 5 dias.


Lavoisier, unidade Moema:

O Lavoisier é dos mesmos donos do Delboni Auriemo. Pode se verificar isso pelo padrão gráfico dos folhetos e pelo prefixo do telefone (pelo menos há 3 anos era o mesmo do Delboni.) O Lavoisier é o laboratório da classe média-baixa e da classe média-média (considerando o fato de ainda existir classe média após dois governos FHC). Se sua carteirinha do plano não tem listras douradas, nem prateadas, muito menos bronzeadas, talvez você acabe fazendo um eletroencefalograma por aqui algum dia.

Ambiente de coleta do sêmen: A ambiente não é dos melhores. O dormitório é amplo, quase uma quitinete. Uma maca situa-se no meio do quarto (fantasia com enfermeiras, hein?). A verdade é que ninguém coleta esperma deitado, porque ocorre vazamento. O melhor jeito de encher o pote é em pé ou sentado com as pernas abertas com o pênis apontado para um dos cadarços.

Material pornográfico: o laboratório disponibiliza apenas material impresso para excitar os clientes. As revistas são boas, de pornografia pesada, com exceção de uma ou outra playboy da Malu Bailo. As páginas de algumas revistas estão coladas, provando que o exame de alguém foi comprometido.

Avaliação geral: Regular


Delboni Auriemo, unidade Av. Brasil:

O Delboni é o laboratório da classe média-alta. Quase todos os planos com um bom custo-benefício o cobrem. Recomendo a eletroneuromiografia e a audiometria na unidade Sumaré, ambos realizados primorosamente. O serviço de café não chega aos pés do Fleury, mas o chocolate quente e o cappuccino com canela extra são altamente recomendáveis.

Ambiente de coleta do sêmen: Para chegar até a minúscula salinha de coleta, é preciso passar pela área de colonoscopia. Ou seja, sempre me pergunto se aquelas gordas na faixa dos 50 anos, preocupadas com o colo do útero, sabem o que eu estou fazendo na sala ao lado. Chega a ser perturbador. Para alguns, é até excitante. O dormitório possui uma poltrona confortável e uma pia.

Material pornográfico: O laboratório possui algumas revistinhas de sacanagem. Nem vale a pena olhar. Quando se tem uma TV 14 polegadas com vídeo, como é o caso, é só acertar o ponto da fita e um abraço. A TV fica no alto, ou seja, é melhor coletar o sêmen em pé, ao mesmo tempo em que você ajusta o ponto do vídeo. Os vídeos de lá costumam ser bons. Cheguei a ter sorte uma vez e assistir um com podolatria.

Avaliação geral:
Bom


Fleury, unidade Paraíso:

O Fleury é o supra-sumo dos laboratórios de análises clínicas. Começa pelo serviço de café, que oferece suco de laranja com ou sem açúcar e sanduíches de tofu ou peito de peru. Os resultados podem ser entregues em casa por uma pequena taxa (nos outros, a taxa é alta). Você é avisado pelo celular quando tudo fica pronto. Na unidade do Jardim Europa, você pode pegar seus exames através do Drive-Thru. Chega a ser emocionante fazer até uma prova rápida para identificação de Estreptococo Beta Hemolítico. O que dizer então de um espermograma?

Ambiente de coleta do sêmen: Aqui não se trata de um simples quarto, mas sim de uma suíte. A iluminação é gentil, o ambiente é aconchegante e não existe cheiro de cândida. A poltrona é confortável, mas fica um pouco longe da TV, também de 14 polegadas. Com exceção disso, todo o resto é feito sob medida para o seu prazer. Dos três laboratórios, é o único que oferece um combo triplo: algodão com anti-séptico, outro com água esterilizada e uma gaze para secar a glande.

Material pornográfico:
Quando a enfermeira lhe dá o potinho a ser enchido, você senta na poltrona e olha para o lado. Chega a se assustar ao ver só duas revistas. Pior, duas playboys, uma daquela surfista horrível que parece o Jeff Daniels e outra do naipe daquela da Virna. Ou Ida do vôlei, sei lá. Mas aí que é você se surpreende: arrasta a poltrona, aproximando-a da TV e, ao ligá-la, descobre que tem em mãos o canal da Playboy e da Venus (o melhor) via sinal digital. Ainda por cima tem sempre uma fita boa ali no vídeo. O prazer é sempre garantido.

Avaliação geral:
Ótimo


Conclusão:
Espero que esse guia ajude não só a você, interessado em fazer o exame, mas também aos donos de laboratórios e cafetões. Se vocês ainda não perceberam, aí vai. Existe um grande nicho a ser explorado no ramo dos espermogramas: a coleta via relaxamento manual feminino, após uma deliciosa massagem tailandesa. Quem paga R$ 165,98 (preço particular no Fleury) por uma simples bronha, com certeza pagaria uma fortuna por um pouquinho mais de AMOR. E isso ainda evitaria, segundo relatos a que tive acesso, um fato bastante contrangedor nesse tipo de exame: o indivíduo broxar e não conseguir saber a morfologia estrita de Kruger dos seus milhões de girinos.

segunda-feira, 2 de abril de 2007

Atlantic City

Dagoberto tinha ejaculação precoce. Era difícil para ele se segurar. Até a pré-adolescência mijou na cama, mas isso não vem ao caso. O maior problema para Dago, na verdade, era outro. Ele não entendia o porquê das mulheres acharem ruim o fato de uma pessoa ejacular rapidamente. Não seria isso uma homenagem àqueles belos corpos femininos? Oras, não se é precoce com uma velhinha de 80 anos, pensava ele. (Segundo Schopenhauer, existe juventude sem beleza, mas não beleza sem juventude, leu ele uma vez). Dagoberto tinha raiva. Muita raiva. Sua ejaculação precoce não era entendida do jeito que deveria ser. Ele amava as mulheres. Aquilo era a manifestação física de todo o seu desejo e paixão por elas. Pobres mulheres leitoras de Nova, repetia ele.

Por tudo isso, Beto resolveu se matar. Decidiu se jogar no Rio Pinheiros.

Tomou um último chopp no Filial, ali na Vila Madalena. E seguiu em linha quase reta até a marginal. Próximo de chegar lá, já na rua Capri, avistou uma bela ninfeta de 12 anos. Com certeza já havia menstruado, por isso não havia mal nenhum em desejá-la segundo as leis da natureza. Que belo par de panturrilhas. Eram tão lindas que ele começou a tremer. Era, de fato, a sua última ejaculação precoce. Uma das mais intensas. Não só ele, mas o chão também começou a tremer. O mundo começou a tremer. E Dagoberto foi engolido pela cratera da linha 4 do metrô.

terça-feira, 27 de março de 2007

Ladrão de Casaca Adidas

Na primeira vez que beijou uma garota, Adalberto achou meio salgado. Era um momento doce, dizia sempre sua irmã mais velha, fã de Cecília Meireles. Talvez a menina tivesse comido um tambaqui em crosta de sal grosso com risoto de bacalhau marinado. Ou simplesmente um churrasquinho grego, primo pobre da moussaka, que vinha com três sucos grátis (obviamente para equilibrar o nível de sódio no organismo.)

Na primeira vez que transou com uma garota, Adal acho amargo.

Na primeira vez que fez Golden Shower, a pedido de sua namorada católica e virgem apenas do orifício vaginal, lembrou de seu primeiro beijo. Enquanto engolia as últimas gotas de uréia, Beto pensou: um beijo não é nada salgado perto disso.

segunda-feira, 26 de março de 2007

Em um ano com 26 luas.

Florisberto era funcionário público. E, como todo aspone, era uma pessoa estranha. Obcecado por juntar dinheiro, trocava seus almoços por empadas com azeitonas com caroços. Todo dia.

Quando criança, os amigos impiedosos do colégio, hoje maridos entediados de esposas semi-feias, costumavam chamá-lo de flor. Aquilo o incomodava. Um dia Floris foi até o bosque próximo à sua casa. Colheu uma bromélia e a pôs no cabelo. Veadinho, resmungou o jardineiro municipal. O garoto não ligou. Talvez nem tenha ouvido. O que importa é que ele passou, com o adorno na cabeça, a tarde inteira admirando o caule de uma palmeira. Que caule lindo. Que caule lindo. Que caule lindo. Que caule lindo. Que caule lindo. Que caule lindo. Ó, o crepúsculo.

Florisberto juntou, em 30 anos, mais de 300 mil reais. Gastou 12 mil com a operação de mudança de sexo. Arrependeu-se. Gastou mais 20 mil, agora dólares, para enxertar gordura do bumbum na sua mínuscula glande, que tinha se transformado num pseudo-clitóris. Porém, maratonista e obviamente com um índice mínimo de gordura corporal, não lhe sobrou muito para o recheio de seu pênis. Gastou os outros 228 mil reais em vodca de média qualidade.

segunda-feira, 19 de março de 2007

Perfume de mulher.

Alberto era floricultor. Sabia que, além do perfume, existiam mais diferenças entre um lírio normal e um lírio perfumado que a nossa vã filosofia podia suportar. Trabalhava na banca número 8, ali na Dr. Arnaldo, junto ao cemitério do Araçá. Vinda de Holambra, a flora ia direto para os túmulos ou mulheres semi-úmidas (claro que elas não imaginavam que as flores vinham de uma loja em frente ao cemitério - sabe como são as mulheres. Além do mais, todo relacionamento está fadado à morte mesmo, pensava Alberto. Para ele, dava no mesmo.)

Às nove da noite, deu seu horário. Ele sempre levava uma rosa colombiana vermelha para sua noiva. Tudo bem, às vezes era branca. Com a flor em uma mão e o maço de cigarro na outra, caminhou no sentido da Heitor Penteado. Precisava pegar o metrô, fazer duas baldeações, pegar um ônibus, uma van e andar 3km a pé. À caminho da estação Sumaré, mais precisamente ao atravessar a Cardoso de Almeida, Alberto acendeu um cigarro. Lembrou como conquistara sua noiva. Eu só fumo porque não tenho nada melhor para fazer com a boca, disse para a futura mulher num forró próximo ao largo da batata. Funcionou. Ela arrancou o cigarro de seus lábios e lhe tascou um beijão. Com gosto de hot-dog prensado da cardeal arcoverde, mas um beijão.

Pensativo, Alberto prestava atenção na rosa e no cigarro enquanto caminhava na ponte sobre a avenida Sumaré. Pessoas que não tem nada para fazer costumam praticar rapel e bungee jump por ali. Ele nunca notou. Quando olhou para o lado, viu o que achou ser uma pessoa se jogando. Correu para segurá-la, evitando assim um suposto suicídio. Não funcionou. Os dois caíram. Obviamente, o elástico não estava preso em Alberto.

sábado, 17 de março de 2007

40 anos essa noite.

Roberto era daqueles que não gostava de comemorar seu aniversário. Tinha medo que ninguém fosse. Mas dessa vez era diferente: ia fazer 40 anos. Uma data redonda merece comemoração - diziam seus amigos de firma.

Aos poucos, amoleceu. Resolveu comprar uns sanduíches de metro e chamou todos: do almoxerifado ao CPD. Reservou o salão de festas de seu condomínio pela módica quantia de hum salário mínimo. Contratou um DJ especialista em medleys. Em relação às bebidas, preparou muito ponche. Roberto sabia que tudo isso era brega demais, mas simplesmente se deixou levar pela data redonda. Datas redondadas só acontecem 7 vezes numa vida, pensou ele, se você levar em conta os dados do IBGE.

A festa já acontecia há duas horas. Roberto tinha esquecido o CD da Corona em seu apartamento. Pegou o elevador, abriu a porta e olhou fixamente para a varanda de sua sala. Nesse momento, todos que liam esse texto pensaram que ele fosse se jogar de lá. Não. Ele foi até o quarto e, com o CD da Corona em mãos, pulou da janela.

Caiu em cima de um colega do departamento pessoal, que amorteceu a queda. Roberto e o moço do DP foram encaminhados para o Pérola Byington. O zelador só iria encontrar o CD dois dias depois. E Corona iria virar uma de suas cantoras preferidas.

Roberto quebrou as duas pernas em 15 lugares. Voltou ao trabalho na semana passada. O funcionário do departamento pessoal deixa mulher, uma filha de 12 anos e um menino de 3 meses.